PF acha minutas de quatro ministros do STJ com lobista investigado por venda de decisões
Novos desdobramentos da investigação da Polícia Federal (PF) sobre suspeitas de venda de decisões e vazamento de documentos no Superior Tribunal de Justiça (STJ) apontam para a existência de minutas sigilosas de mais quatro gabinetes de ministros armazenadas em dispositivos do lobista Andreson de Oliveira Gonçalves. O material também estava no celular do advogado Roberto Zampieri, morto no fim de 2023.
Segundo a Polícia Federal, não há por ora indícios de envolvimento direto dos ministros nos vazamentos identificados, mas a origem desses documentos permanece sob apuração. A defesa de Andreson optou por não comentar o caso. Já os ministros citados alegaram desconhecimento dos vazamentos e negaram qualquer favorecimento a partes representadas pelo lobista, conforme informou O Estado de S. Paulo.
Alcance das investigações da PF e ações do STJ
A análise da PF abrange gabinetes dos ministros Isabel Galotti, Moura Ribeiro, Nancy Andrighi e Og Fernandes, que já eram alvo de apuração desde o fim do ano passado. Na ocasião, eles informaram ter solicitado ao STJ a instauração de sindicâncias e reforçaram não ter conhecimento prévio dos vazamentos.
O STJ comunicou, à época, a abertura de sindicâncias para investigar suspeitas de envolvimento de servidores nos vazamentos e acionou a Polícia Federal para ampliar as investigações. As sindicâncias seguem em andamento, sem conclusão até o momento.
“A presença dessas minutas, com certas semelhanças às decisões oficialmente publicadas, não implica, por si só, em suspeitas quanto à conduta dos ministros”, diz o relatório da PF divulgado pelo O Estado de S. Paulo. “Entretanto, constitui elemento que não pode ser desconsiderado, exigindo análise criteriosa e, se necessário, diligências adicionais, a critério da autoridade policial, para assegurar a integridade e autenticidade dos documentos em questão.”
A PF informou que, nos próximos dias, vai entregar ao ministro Cristiano Zanin um relatório parcial com os avanços da investigação, principalmente sobre assessores do STJ. Segundo documento enviado ao ministro, há “volume expressivo de novas provas” e a intenção é ampliar o escopo das apurações em curso.
Novas provas e falsificação de documentos
De acordo com a PF, parte significativa desse material reforça hipóteses já levantadas, além de expandir a investigação ao revelar conexões antes desconhecidas, o que exige reorganização lógica dos elementos já constantes dos autos.
Entre as provas, foram localizadas minutas com trechos semelhantes a decisões oficiais dos ministros, além de indícios de que Andreson criava documentos falsos do STJ para atrair clientes. Foram encontrados modelos com marca-d’água da Corte e uma falsa decisão de prisão atribuída ao ministro Og Fernandes, relacionada à Operação Faroeste, que nunca existiu de fato.
A suspeita da PF é que essas informações falsas eram usadas pelo lobista para tentar extorquir um empresário, o que pode afastar a hipótese inicial de vazamento do gabinete do ministro Og Fernandes. O gabinete do ministro não se manifestou sobre o tema.
O gabinete do ministro Marco Buzzi se manifestou por meio de nota. “O gabinete do Ministro Marco Buzzi informa que não possui conhecimento sobre o vazamento de trechos das deliberações referidas pela reportagem”, diz a nota. “Esclarece, todavia, que os projetos de decisões são minutados em sistema interno do Tribunal, sendo que os processos mencionados foram examinados, mais de uma vez, em colegiado, recebendo julgamentos unânimes.”
Detalhes sobre as minutas encontradas
O relatório da PF também relata que o lobista possuía a minuta de um voto do ministro Ricardo Villas Bôas Cueva para julgamento da 3ª Turma do STJ. O arquivo, encontrado no notebook de Andreson, foi criado quatro dias antes da sessão de julgamento realizada em 6 de fevereiro de 2024. O gabinete do ministro não se pronunciou.
Outro documento encontrado no notebook de Andreson era a minuta de uma decisão do ex-ministro Paulo de Tarso Sanseverino, morto em abril de 2023. O arquivo foi criado um dia antes da publicação oficial da decisão e tinha como criador o usuário “Secretaria de Tecnologia da Informação e Comunicação”. Para a PF, “em simples comparação da minuta com a decisão exarada pelo ministro, verificou-se que o teor parece ser o mesmo”.
A Secretaria de Tecnologia da Informação e Comunicação está vinculada à direção-geral do tribunal, sendo responsável pela administração dos sistemas de informática, não ao gabinete do ministro envolvido.
Origem das investigações da PF e novas descobertas
A apuração teve início depois da apreensão do celular de Roberto Zampieri, assassinado em dezembro de 2023 em Cuiabá. O equipamento foi recolhido para investigar o homicídio, mas o Ministério Público de Mato Grosso identificou sinais de compra de decisões judiciais e repassou o material ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que detectou diálogos entre Zampieri e Andreson, levando o caso à PF.
Análises posteriores da PF no celular de Zampieri revelaram novas minutas de documentos do STJ, fora do escopo inicial da investigação. Esses arquivos, enviados por Andreson, passaram por uma análise comparativa entre as datas de criação e a divulgação pública no sistema do tribunal.
A Polícia Federal constatou, por exemplo, que o lobista teve acesso à minuta de relatório e voto do ministro João Otávio de Noronha em um julgamento de recurso do Estado do Pará. O documento, compartilhado por Andreson, foi criado antes da publicação no Diário Oficial, embora enviado depois da sessão de julgamento. O gabinete do ministro esclareceu que as decisões foram tomadas de forma unânime pelo colegiado.
Outra evidência revela que Andreson compartilhou com Zampieri, em 16 de agosto de 2019, uma minuta de decisão do ministro Antônio Carlos Ferreira, referente a disputa de indenização entre duas empresas gaúchas. A decisão foi proferida somente em 1º de outubro de 2019, com o recurso sendo negado.
Embora esse caso tenha sido mencionado em relatório complementar do CNJ no ano passado, ainda não tinha sido citado pela PF na investigação. O ministro Antônio Carlos afirmou ter pedido à presidência do STJ a abertura de investigação sobre a origem do vazamento assim que tomou conhecimento do fato, ainda em 2024.